Por Cláudio Guimarães
Confira a entrevista e as histórias deste grande ídolo:
Quando chegou a Belo Horizonte?
Cheguei a Belo Horizonte em janeiro de 1971 e sai após a Copa do Mundo de 1974, onde fui capitão da seleção argentina.
Como foi a sua adaptação a cidade?
Não me adaptei rapidamente. Custei a me acostumar. Não entendia o idioma , a comida era muito diferente. Depois me adaptei. No primeiro ano morei no centro da cidade na Avenida Afonso Pena esquina com Rua Espírito Santo. Era bom porque estava bem localizado e não faltava nada. Eu agradeço demais ao goleiro Raul que foi o jogador que mais me ajudou fora de campo a me adaptar as características da cidade e do povo mineiro.
Por que deixou o Cruzeiro em 1974?
Voltei para Buenos Aires depois que minha esposa adoeceu da tireoide. Ela optou por fazer o tratamento na Argentina.
A torcida do Cruzeiro o vê como um grande ídolo até hoje. Como o senhor avalia esse carinho mesmo de longe?
Na época, Cruzeiro estava procurando um defensor para o lugar do Procópio que se lesionou. Daí eu cheguei a Belo Horizonte. Eu me adaptei muito rápido ao time do Cruzeiro. Tinham grandes jogadores e era muito fácil jogar. Acho que a torcida se identificou comigo por causa do meu comportamento em campo. Eu me dedicava em todos os jogos da mesma maneira, independente se era contra um clube do interior ou em um clássico contra o Atlético
O Senhor foi ídolo do Cruzeiro e capitão do selecionado argentino na Copa de 1974. Sorin também foi um grande ídolo celeste e capitão da Seleção de seu país em 2006. A que você atribui esse feito?
Para mim foi uma grande coincidência. Um fenômeno que só o destino pode explicar. Acho que a minha chegada e o meu bom desempenho com a camisa do Cruzeiro abriu espaço para os demais atletas que foram a Belo Horizonte em seguida. Sorín seguiu o caminho que fiz e também foi muito feliz tanto que mora em Minas. Ele tinha um desentendimento com o Ramon Diaz, treinador do River Plate na época, e decidiu ir para o Cruzeiro. Foi muito feliz e manteve as portas abertas. Montillo e Farías comprovam isso e continuam estreitando a ligação existente entre o Cruzeiro e os argentinos. Isso é muito positivo. Em breve mais e mais jogadores daqui atuarão pelo celeste de Belo Horizonte.
O que o Cruzeiro representa em sua vida?
O Cruzeiro foi uma oportunidade fantástica que tive em minha carreira. Hoje os jovens querem jogar na Europa, eu queria jogar no futebol brasileiro. Sempre sonhei em atuar no Brasil e o Cruzeiro realizou este sonho. Para mim foi maravilhoso jogar em um clube de muitas estrelas. Essas estrelas não eram apenas as que brilhavam na camisa, elas estavam dentro do campo, Piazza, Tostão, Dirceu, Evaldo, Raul, Roberto Batata, Nelinho, Palhinha, Eduardo.
Depois apareceu um grande fenômeno. Joãozinho foi demais! Como corria. Era impressionante! Ele jogava e parecia que bailava em campo. Dava gosto ver. João não jogava futebol, brincava! Tenho muitas saudades dessa época. Principalmente do torcedor do Cruzeiro. Sempre apoiava a equipe mas tinha um respeito enorme por todos os jogadores do time.
O que é necessário para se ter um bom setor defensivo dentro de uma equipe?
Um bom defensor tem que reunir a garra, a técnica e a velocidade de pensamento. É preciso que haja um xerife em campo. Uma zaga precisa ter dois atletas que reúnam essas características e que se complementem. Um precisa ser mais habilidoso e o outro impor o respeito necessário para que os atacantes adversários não ganhem confiança. Eu tentava fazer os dois papéis ao mesmo tempo. Apesar de magro, eu era muito alto e forte fisicamente. Isso eu aliava a técnica então ficava mais fácil para atuar, principalmente no time do Cruzeiro.
Qual o segredo para ser um bom defensor?
Um defensor não tem que jogar o lance em si. Ele não pode simplesmente ir ao encontro da bola. Antes de qualquer coisa tem que antever a jogada que será feita pelo atacante. O jogador de defesa deve, em primeiro lugar, ter uma velocidade de pensamento muito maior do que qualquer outro jogador que esteja em campo. Ele precisa saber o posicionamento de seus companheiros de zaga, do goleiro e ter uma leitura bem feita das principais jogadas que o seu adversário possui. Não basta apenas treinar, treinar e treinar. Tem que estudar, prestar atenção naquilo que o treinador deseja e, principalmente, na forma de atuar do atacante que vai tentar furar o bloqueio dele em uma partida.
Outra coisa que é fundamental para o bom zagueiro é a sua imposição física diante do atacante. O adversário jamais pode te deixar no chão em um choque. O defensor sempre deve levar vantagem sobre o atacante e, como o goleiro, não pode errar. Se o atacante te deixar no chão, ele ganha moral e vai para cima de você em todos os outros lances da partida. Isso é mortal para um defensor.
Quem foi o atacante mais difícil que o senhor marcou durante a carreira?
Enfrentei grandes atacantes durante a minha carreira mas Dario, o Dadá Maravilha, foi um grande adversário. Um atacante que sabia se impor fisicamente. Era muito difícil marca-lo e controla-lo. Ele era um imprevisível. Muitos diziam que ele não saiba jogar futebol. Que engano! Dario era impressionante, cabeceava muito bem, chutava forte e ainda se colocava como ninguém na grande área. Dava trabalho a todos os defensores e não é atoa que conquistou tantos títulos e marcou centenas de gols.
Como foi o período em que o senhor jogou no futebol brasileiro?
Na década de 70, o futebol brasileiro tinha uma safra incrível de jogadores em todas as regiões do país. Existiam grandes equipes de norte a sul. Era tão difícil jogar tanto em Recife quanto em Goiania e em Porto Alegre. Cada lugar com suas características mas sempre muito competitivo. Era impressionante. Foi uma das melhores épocas da história do futebol brasileiro. Eu tenho orgulho de ter participado e enfrentado craques do quilate de Rivellino, Gerson, Clodoaldo e ter jogado ao lado de Piazza, Tostão, Dirceu, Evaldo, Raul e Zé Carlos.
Como era a sua preparação para enfrentar todas essas feras?
Eu não treinava muito nessa época. Aliás, no Brasil, de uma forma geral, não se treinava muito. Jogávamos duas vezes por semana. No início do ano cuidávamos da parte física e depois fazíamos excursões para fora do Brasil. Jogamos no México, Europa e até na Austrália. A minha sorte é que o meu tipo físico, sempre fui muito magro, me ajudava bastante. Eu me preocupava mais com a parte mental, a inteligência para enfrentar os adversários.
O senhor se lembra do Campeonato Mineiro?
Na minha época o Campeonato Mineiro era muito difícil. Principalmente por causa das viagens. A maioria das vezes viajava de ônibus. Jogávamos em Uberaba, por exemplo, e ficávamos quase 12 horas na estrada. Quando chegávamos na cidade, sempre tínhamos um adversário difícil pela frente. Jogar contra o Cruzeiro era a mesma coisa que disputar uma final de Copa do Mundo. Tínhamos muito trabalho. Na última vez que conversei com Montillo até comentei sobre o Estadual com ele.
Quais as lembranças que o senhor tem do Campeonato Brasileiro?
O Brasileirão era tão duro quanto o Estadual, alias, muito pior. Viajávamos demais e conheci praticamente todo o Brasil. Joguei em Manaus, em Recife e sempre as quatro da tarde. Era difícil demais enfrentar os donos da casa. Me lembro de uma partida contra o Santa Cruz onde fazia mais de 35 graus em Pernambuco e o estádio estava completamente lotado, parecia um caldeirão. Era sacrificante mas valia a pena jogar para o torcedor brasileiro, apaixonado pelo futebol.
O que o senhor pensa de Montillo, Farías e Victorino?
Victorino é um bom jogador mas ainda não o conheço bem. Montillo é fora de série. Farías é um grande artilheiro. Não sei porque ainda não é titular do time. Ele precisa de uma sequência para provar que é um bom atacante. Pode fazer muitos gols e também ser ídolo da torcida.
Raio X do craque
Roberto Alfredo Perfumo
Sarandí, 3 de outubro de 1942
Clubes que defendeu – Racing (207 jogos), Cruzeiro (138 jogos), River Plate (104 jogos)
Seleção Argentina – Disputou a Olimpíada de Tóquio em 1964 e as Copas do Mundo de 1966, na Inglaterra e de 1974, na Alemanha.
Títulos
Racing - Campeão Argentino em 1966, Campeão da Libertadores e Mundial em 1967
Cruzeiro – Tricampeão Mineiro – 1972, 1973 e 1974 – Vice campeão brasileiro em 1974
River Plate - Campeão do torneio Clausura e Apertura em 1975 e Nacional em 1977
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