Em 07/04/1993 eu tinha 18 anos de idade, trabalhava em um pequeno comércio dos meus pais, fazia Publicidade e Marketing no Mackenzie, jogava basquete pela Faculdade, namorava uma garota de 15 anos (linda, linda, linda), tinha um topete que há muito tempo eu não tenho mais, pesava uns 10 quilos a menos e o São Paulo Futebol Clube era o atual campeão da Libertadores, o atual campeão Mundial e o atual bicampeão paulista.
E a Libertadores 93 começou exatamente nesse dia para o São Paulo. Por ironia do destino, exatamente contra o clube argentino que nos trouxe imensas alegrias (e sofrimento) no ano anterior, o Newell’s Old Boys. O clube argentino já não era o mesmo do ano anterior, mas mesmo assim ainda contava com o lendário goleiro Scoponi,Mendoza, entre outros bons jogadores. O São Paulo estava com um elenco ainda melhor que o da Libertadores passada, além disso o time estava muito mais entrosado e causava ainda mais pavor nos adversários.
Mas pavor não foi o que o Newell’s sentiu dentro de casa: Em Rosário, o Tricolor não foi nem sombra da equipe aguerrida e técnica da Libertadores passada, por isso sofreu uma derrota inesperada por 2 a 0, o que para muitos comentaristas selava nossa eliminação na mais importante competição do continente, naquelas velhas certezas dos ditos especialistas e que pioraram nos dias atuais. Vale destacar que nessa época, o campeão do ano anterior entrava na disputa diretamente nas oitavas de final e a discussão da época era se isso era bom ou ruim. O São Paulo provou no decorrer da competição que isso era ótimo.
Em 07/04/1993 eu praticamente não assisti ao jogo que passou na Globo. Entre algumas espiadas na TV, o namoro rolava solto no sofá. Namoro recente com a garota linda que já citei no primeiro parágrafo. Lembro que nos gols do Newell’s minha vontade era de xingar, mas ao olhar para aquele rosto, que não estava nem aí para a partida, relaxei e esperei o empate ou uma virada que não veio. Ofegante pelos longos beijos e chateado pela derrota, me despedi da minha pequena para o longo trajeto até em casa.
Durante essa semana faltei uns 3 dias na Faculdade para me encontrar com aquela ninfeta que eu julgava naqueles dias que seria a mulher da minha vida. Ledo engano.
Os dias seguintes à derrota foram de expectativa em relação ao segundo jogo. O elenco todo mostrava uma confiança absurda para o jogo de volta, a ponto do meu otimismo ir voltando aos poucos naqueles longos dias que não passavam. Na semana do jogo fui à Faculdade na segunda e na terça-feira, mas fui intimado a faltar na quarta e comparecer à casa da linda ninfeta, pois ela dizia que estava com saudades. Não nos víamos desde o domingo.
No dia do jogo assisti ao Globo Esporte e senti que o Raí estava me convocando para a partida (na verdade ele convocava a torcida Tricolor). Em momento algum tinha pensado em ir ao jogo após a derrota, mas como eu tinha comparecido a todos os jogos da Libertadores 92 e o São Paulo tinha conquistado o título, fui acometido daquela velha superstição de torcedor que nos aponta que devemos fazer algo para não prejudicar nosso time do coração. Hoje uso uma certa camisa do São Paulo e sempre tenho o meu Labrador vendo o jogo comigo na sala. Quem aqui nunca teve essas superstições, que atire a primeira pedra.
E lá fui eu ao Morumbi. Sozinho…
… E de lá voltei sozinho e já sem namorada, mas com um amor incondicional por aquela equipe.
A ninfeta, que não torcia para time algum, não perdoou a minha suposta "traição". Imagine só trocar ela pelo São Paulo Futebol Clube.
E não me arrependi disso em momento algum da troca, pois o São Paulo teve uma atuação de gala, daquelas que vou me lembrar sempre, uma atuação que vou contar aos meus netos e aumentar a performance de cada um dos atletas que estiveram no sagrado gramado do Morumbi naquele dia. O Raí foi brilhante, fez dois gols e judiou do time argentino. O Cafu, traidor para muitos, teve uma atuação espetacular, correndo como um louco, marcando, atacando e marcando um dos gols. O Dinho deu uma pancada de fora da área e contou com um desvio no caminho. O Palhinha, que sempre achei fenomenal pela inteligência, deu passes açucarados e impressionantes. Para se ter uma idéia do que foi Palhinha no auge, procurem no youtube o 2º gol contra o Flamengo nessa mesma Libertadores 93. Todos foram fenomenais em campo, pois proporcionaram uma atuação que levou o torcedor Tricolor ao êxtase e a certeza que um novo título viria.
Não sei se é exagero da minha parte, mas realmente considero essa a maior atuação do São Paulo nos anos Telê. E olha que teve muitos outros jogos que podem almejar esse título. A final do Mundial contra o Barcelona, o primeiro jogo contra o Palmeiras pela decisão do Paulista 92, o primeiro jogo da final da Libertadores 93 contra o Universidad, as atuações contra o Flamengo no Maracanã na mesma Libertadores e na final da Supercopa 93 (os dois jogos), os 3 a 0 do Raí em cima do Corinthians em 91, os 6 a 1 na despedida do Raí contra o Santos, entre outros jogos inesquecíveis.
Hoje em dia vemos o sufoco que é ganhar de um time argentino na Libertadores (Seleção é baba) . Por esse histórico das disputas entre times brasileiros e argentinos, percebe-se a grandeza do feito do São Paulo, tirando uma diferença de 2 a 0 e enfiando um 4 a 0 contundente, ainda assim um placar modesto se assistirmos aos melhores momentos dessa partida. Para não ser tido como mentiroso, ainda tenho um dvd com uma compilação dos melhores momentos de todos os jogos da Libertadores 93, e é impressionante a quantidade de chances perdidas nesse jogo. 8 a 0 seria pouco, assim como foi muito pouco o 1 a 0 da semifinal contra o Cerro Porteño.
Nesse 14/04/1993, mais ou menos 40 mil torcedores estavam presentes, pois também responderam ao chamado do capitão Raí e de outros jogadores, altamente confiantes na classificação da equipe. Nesse dia fiquei no meio da Independente, lá na arquibancada azul, bem no centro da arquibancada. Bons tempos da Independente de Ferrão e Adamastor, dos bandeirões, da bateria afinada, mas já contei desses bons tempos em uma de minhas colunas anteriores (http://blogdozanquetta.ikaria.kinghost.net/?p=9833).
Bom, o resumo da ópera foi que o São Paulo passou adiante e atropelou Flamengo, Cerro Porteño e Universidad Católica, sempre com minha presença nos jogos do Morumbi. Nos tornamos bicampeões da Libertadores e poucos meses depois ganhamos a Supercopa (já sem o Raí), em dois jogos eletrizantes contra o Flamengo, onde as duas equipes jogaram demais. Terminamos o ano ganhando do Milan, em uma aula de aproveitamento das chances criadas, tal qual aconteceria 12 anos depois contra o Liverpool.
E claro, perdi a namorada. E nem adiantou argumentar.
Na Libertadores 94 acabei perdendo um único jogo por causa do trabalho. Exatamente o jogo contra o time do Sierra, pois aconteceu em uma quarta-feira a tarde e não havia outra pessoa para poder ficar no meu lugar.
Resultado: Uma frustração tremenda, exatamente 3 dias após o meu aniversário de 20 anos e uma cisma que fui eu o culpado, já que faltei em um jogo em que não poderia faltar. Se um dia larguei a namorada pelo São Paulo, não consegui deixar pai e mãe na mão no trabalho.
Espero que vocês possam me perdoar…
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