Belo Horizonte, 28 de novembro de 1973. José Guilherme Ferreira Presidente da Federação Mineira de Futebol recebe uma comunicação da CBD. O jogador Cosme da Silva Campos estava suspenso por 60 dias, preventivamente, porque os exames de laboratório haviam constatado a presença de efedrina em sua urina, após a partida contra o Vasco, dia 18 de novembro de 1973, no Mineirão (Atlético 2X1 Vasco)
Convocados para uma reunião de emergência chegaram o médico-chefe, Dr Abdo Arger, os Drs. Haroldo Lopes da Costa- que cuidava da contusão de Campos e atendeu ao médico da CBD no dia 18- e Roberto Carlos Duarte, o dentista José Helvécio de Sousa, os advogados Flávio Dalva Simão e João Claudino e o Chefe do Departamento Técnico, Fernando Alves.
Quinze minutos depois, com o presidente Nélson Campos, chega o atleta Campos.
-É o problema mais grave que apareceu em todos os meus mandatos no Clube -dizia Nelson Campos.
-Eu não tomei nada, só os remédios do médico e do dentista para o tratamento da boca. –dizia Campos atleta.
Trancaram-se para uma reunião no Hotel Brasil na Praça Sete em BH. Duas horas depois, apenas uma decisão concreta: a convocação de um especialista para analisar os remédios e estudar as possibilidades de aparecimento da droga. O professor José Elias Murad, com vários livros publicados sobre drogas, se prontifica a assessorar o Clube.
- No dia 5 de novembro de 1973 fui procurado pelo Dr. Haroldo e pelo jogador Campos. Ele voltava do Rio, onde, na véspera, havia sido atingido. Sofrera um corte no lado interno da boca, perdera três dentes e tivera os demais abalados. Fiz um tratamento de urgência, mas adverti que seria necessária uma cirurgia. Para conciliar o tratamento com sua presença no time, resolvemos - eu, o Dr Haroldo, o jogador e o técnico Telê Santana – que a cirurgia poderia ser feita dia 19. Durante o tratamento, Campos tomou antiinflamatórios, antibióticos, e analgésicos (Parenzine, Patomicina, Tetraciclina, Dorflex e Novalgina) Nenhum destes medicamentos esta na relação dos considerados com doping. Mas só um químico pode afirmar isso com segurança absoluta. Será bom, para elucidar tudo.(Dr. Helvécio de Sousa , dentista)
Nova reunião no Atlético. Discutia-se as providências possíveis e sua eficácia- 1) pedir efeito suspensivo; 2) recorrer ‘a Justiça comum; 3)requerer, imediatamente, o exame da contraprova.
Na CBD, apenas uma resposta: quem está cuidando disso é Valed Perry. Que não estava mais lá. 13H. Valed Perry desembarca na Pampulha. Enquanto no Atlético todos esperam sua chegada. 15h. Doze pessoas estão na sala de reuniões, quando chega Perry.
Ainda não está comprovado o uso de doping pelo jogador. Como a lei manda que se aplique a suspensão preventiva, eu faço agora. Vim a Belo Horizonte apenas para trazer a palavra oficial da CBD. Quanto ao fato de os exames não serem feitos em universidades, com recomenda a portaria do ministro da Educação, deve-se ao alto preço cobrado pela única do Rio que poderia faze-los. Daí recorreremos a um laboratório particular, de confiança da CBD. (Valed Perry)
Em reunião, Valed Perry e os homens do Atlético debateram o problema – " "inédito para a própria CBD" , segundo ele , quanto mais para o Atlético. Um dos pontos mais obscuros relaciona-se aos prazos. Por que o jogo do dia 18 só teve resultados no dia 26? E por que estes resultados só foram comunicados a Campos e ao Atlético dia 28?
No Rio, na mesma tarde de quinta-feira, deslanchava-se uma verdadeira corrida a clinica de Lídio Toledo, supervisor do controle de anidoping no Campeonato Brasileiro.
-Quarenta e oito horas antes de cada rodada a CBD escolhe dois jogos. Sou comunicado do fato na mesma hora. Escolho, então, um médico. Ele escolhe dois jogadores de cada time. No começo do segundo tempo, avisa aos médicos dos dois Clubes quais os jogadores escolhidos. No fim do jogo, o nosso médico recolhe o material de cada jogador, em duas provetas, enquanto os médicos preenchem uma fica, onde indica, entre outras coisas, os medicamentos fornecidos ao atleta nas últimas quarenta e oito horas. O Dr. Haroldo explicou que a urina vermelha de Campos se devia a ter ele comido beterraba no almoço. Mas eu só soube da intervenção cirúrgica e do tratamento com remédios pelos jornais. Na sua ficha está escrito: "Nada a declarar!". (Lídio Toledo)
Em BH decidi-se que o presidente da Federação Mineira voltará com Valed Perry paro o Rio para tentar o efeito suspensivo ou outra providência. No Rio, perguntava-se pela segunda proveta, a da contraprova. "Está numa geladeira"-é a informação mais precisa que se pode – ou se quer? – fornecer. Se a geladeira está na CBD, no laboratório ou em qualquer outro ponto, o Dr. Lídio, responsável pelas provetas, não disse.
Valed e José Guilherme partem para o Ria. Ficam em BH, a bronca da torcida e a segurança das declarações do professor Elias Murad:
O exame de laboratório – cromatografia em camada delgada- indica a presença de efedrina. Campos tomou vários comprimidos de Dorflex no dia da partida e este medicamento é derivado da efedrina. Considero o problema simples de fácil defesa científica. (José Elias Murad)
No Rio, a segunda proveta já havia deixado a geladeira da CBD rumo ao laboratório do Dr. Marcos Feldman. Os novos exames, iniciados no mesmo dia, tomarão oito dias até o resultado final e serão do tipo espectrografia mais minuciosa.
Quando chegam os homens do Atlético prontos para encaminha o pedido de efeito suspensivo, não há mais ninguém, a não ser o mesmo Valed Perry. Desta vez com uma nova nota oficial- a RDI número 21/73- em quem a CBD"nega acolhida ao pedido de reconsideração da suspensão preventiva aplicada ao atleta Cosme da Silva Campos por envolver questão de mérito". Alega a CBD, na nota, que lhe falta competência para decidir a questão, já que as sindicâncias estavam em andamento, sob a orientação de Aníbal Moreira Pellon. Como o atleta não comunicara o uso de qualquer medicamento, competia-lhe aplicar a suspensão no momento em que se constara o resultado positivo..
Partem, então, os homens do Atlético, desta vez rumo a Brasília, procurando o mais alto escalão da hierarquia esportiva, o ministro da Educação, Jarbas Passarinho.
O assunto, em 72 horas , ficou mais longe das paixões. As coisas tornando-se menos turvas, deixando alguns pontos importantes comprovados.
)A omissão do Dr. Haroldo Lopes Costa no preenchimento da ficha quanto aos medicamentos fornecidos pelo Dr. José helvécio transformou a presença de efedrina na urina colhida de Campos de um fato corriqueiro, no primeiro caso de acusação oficial de doping no futebol brasileiro. Alertado pelo médico quanto ao conhecido Dorflex, o laboratório provavelmente chegaria à efedrina sem surpresa, assim como a CBD recebia o relatório e , talvez, não o encaminhar juridicamente da forma precipitada que fez.
2)Por outro lado, a vacilação da CBD, com a bomba nas mãos de segunda a quarta, sem que ninguém a fizesse explodir ou a desarmasse, aumenta a lista de omissões.
3) Para completar, o próprio jogador Campos, pivô do todo o caso: capaz de lembrar de meia dúzia de fatias de beterraba traçadas rapidamente no almoço, esqueceu-se de dizer ao médico recolhedor de sua urina,que havia uma semana, mal podia falar ou comer, porque tinha a boca machucada e tomava, dia e noite, muitos remédios. Mas um fato foi claro. Apesar de todos os erros aqui listados somente o jogador Campos pagou -e pesadamente- pelo seu erro. O estigma do dopping o acompanhou por toda carreira e o outrora promissor jogador teve sua carreira naquele momento condenada para sempre.
-Dizem que corri adoidado contra o Vasco e fiz dois gols. Palhaçada pura. Os gols surgiram de falhas da defesa. Foram fáceis de fazer. Chega de ser Capacho. Vou ter de reagir ‘a altura. Dessa vez foi demais.(Campos)
Tudo Sobre Cosme da Silva Campos:
Cosme da Silva Campos, o Campos, ex-atacante do Atlético Mineiro, Santos, Nacional-AM, Guarani, Náutico, São Bento-SP, Marília, Portuguesa e São José, nas décadas de 60, 70 e 80. Em 72 foi um dos artilheiros do Brasileirão jogando peloNacional-AM. Na temporada seguinte, de volta ao Galo, vivia em grande fase e era cotado para a Seleção Brasileira que disputaria a Copa do Munda da Alemanha OC em 74. Depois das graves acusações o atleta que na época vivia em grande fase nunca mais jogou como antes. Foram seis meses de suspensão, as boas atuações nunca mais se repetiram e o sonho da seleção sumiu. Ainda nos dias de hoje, Campos afirma que não teve culpa. Ele tomava os remédios indicados pelo médico do Atlético, Dr. Haroldo Lopes da Costa, que não informava a CDB. Hoje mora em Pedro Leopoldo-MG, sua terra natal e trabalha na lavanderia Banho de Espuma que tem em sociedade com sua irmã. Campos encerrou a carreira aos 32 anos, no São José-SP.
Cosme da Silva Campos
Posição: Centroavante
Data de Nascimento: 21/12/1952
Cidade: Pedro Leopoldo-MG
Período no Atlético: 1970-1972 e 1973-1976
Primeiro jogo: 08/11/1970
Atlético 1x1 Carlos Chagas-MG – Amistoso
Último Jogo: 27/06/1976
Atlético 1x1 Caldense-MG – Campeonato Mineiro/1976
Clube Anterior: Categoria de Base do Atlético
Clube Posterior: Guarani-SP
No Atlético: Foram 199 Jogos e 97 Gols Marcados;
Títulos pelo Atlético:
Campeão da Taça Belo Horizonte – 1971 e 1972
Campeão da Taça Minas Gerais – 1975 e 1976
Campeão Mineiro – 1976
Sua carreira:
ATLÉTICO (1970-1971); América-SC; ATLÉTICO (1972); Caldense-MG; Nacional-AM; ATLÉTICO (1973-1976); Guarani-SP; Náutico-PE; São Bento-SP; América-MG; Santos-SP; Operário-MS; Colorado-PR; Nacional-AM; Ceará-CE; Portuguesa-SP; Ferroviária-SP; Operário-VG; Marília-SP; São José-SP e Curvelo-MG.
Jogou 05 jogos pela Seleção Brasileira, todos pela Copa América de 1975, marcando 2 gols.
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