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04/04/2009 - "Se Pelé não tivesse nascido homem teria nascido bola"

Edson Arantes do Nascimento – Pelé



O Rei Pelé

Quem gosta de futebol e teve a sorte de ver Pelé em campo, pode se considerar um ser humano privilegiado



A história do maior craque de todos os tempos começa com uma derrota. A derrota de um jovem chamado Dondinho em driblar a pobreza usando o futebol como instrumento. Tudo aconteceu no final dos anos 30. Depois de passar por um sem-número de pequenos times no interior de Minas Gerais, Dondinho havia finalmente conseguido uma chance no poderoso Atlético Mineiro. "Naquele tempo, os jogadores de frente jogavam plantados. Dondinho fazia diferente. Ele vinha de trás, com a bola dominada e, por isso, chamava a atenção", recorda o jornalista mineiro Gérson Sabino.

Dondinho treinou e aprovou no Galo. Foi até morar com a mulher, Celeste, num quartinho localizado embaixo da arquibancada do estádio do Atlético. Sua estréia aconteceu no dia 9 de março de 1940, num amistoso contra o São Cristovão, do Rio de Janeiro. Mas num lance com o duro zagueiro Augusto, mas tarde capitão do Vasco e da Seleção Brasileira, Dondinho se machucou feio. "Água no joelho", sentenciou o massagista - naquele tempo, o mundo do futebol ainda desconhecia os meniscos. O canditado a jogador nunca mais foi o mesmo. O problema o obrigou a voltar para o minguado futebol do interior. O pior era que Celeste carregava na barriga seu primeiro filho.



O futebol de Dondinho morreu naquele ano de 1940. Todo esse drama pessoal de mais um obscuro jogador brasileiro passaria ao anonimato não tivesse seu filho se tornado o mais reverenciado craque de todos os tempos. Édson Arantes do Nascimento, Pelé, nasceu no dia 23 de outubro daquele mesmo ano com o destino de vingar as derrotas de seu pai e, num sentido mais amplo, as derrotas de todos os brasileiros.



O DESCOBRIDOR A honra de descobrir Pelé cabe a Waldemar de Brito, considerado um grande atacante (do São Paulo) entre 1935 e 1945. Waldemar chegou à cidade de Bauru, em 1953, para organizar o time infanto-juvenil do Bauru Atlético Clube, o Baquinho. Na primeira peneira, o novo técnico já ficou deslumbrado com aquele negrinho magrela que entortava os demais garotos e marcava gols aos montes. Em 1956, quando Waldemar deixou a cidade, prometeu voltar para buscar o menino. "Cuida bem desse garoto, que ele é uma dádiva de Deus", recomendou a dona Celeste que, até então, era contra a entrada do filho no futebol. Meses depois, Waldemar voltou e levou Pelé para o Santos.



HERÓIS DE ÁLBUM Pelé chegou a santos no dia 8 de agosto de 1956, com apenas 15 anos. Waldemar de Brito entregou o garoto ao treinador Lula e ao craque Jair da Rosa Pinto, que encerrava sua carreira no time da Vila Belmiro. Os demais jogadores se espantaram com a pretensão daquele moleque em treinar no clube. O debochado Zito até combinou de fazer o menino de bobinho no primeiro coletivo. Mas, à noite, quando entrou no quarto de Pelé, Zito viu um álbum de figurinhas sobre a cama. Nele estava escrito com letra de menino: "Deus é tão bom para mim que vai me fazer jogar tanto quanto Zito, chutar tanto quanto Pepe, driblar tanto quanto Pagão". Zito desistiu da brincadeira. No dia seguinte, Pelé treinou e já fez um gol. Era realmente um fenômeno.

Um mês depois, marcou seu primeiro gol oficial, metendo a bola no meio das pernas do goleiro Zaluar, do Cotinthians de Santo André. Em menos de um ano, mais precisamente no dia 7 de julho de 1957, estreava na Seleção Brasileira e (adivinhem!) marcava um gol. O Brasil acabou perdendo para a Argentina (2 a 1, no Maracanã), mas a história ia mudar a partir dali.



A REALEZA DE PELÉ Um dos primeiros a perceber a realeza de Pelé foi o escritor Nelson Rodrigues. "Dir-se-ia um rei (...) sua majestade dinástica há de ofuscar toda a corte em derredor", escreveu Nélson, numa crônica profética publicada na revista Manchete Esportiva, em 8 de março de 1958. A coroação internacional foi questão de meses. Na Copa da Suécia, Pelé deslumbrou o mundo com apenas 17 anos e passou a ser chamado de o Rei do Futebol.

Com ele, o Brasil deixou de ser apenas mais um país do Terceiro Mundo, conseguindo sentir orgulho por ser conhecido e respeitado - pelo menos no futebol. A Era Pelé se traduziu em um tricampeonato mundial de futebol e na posse definitiva da Taça Jules Rimet. O Rei jogou 114 partidas e marcou 95 gols com a camisa amarela. Nas quatro Copas do Mundo que disputou, nas inúmeras excursões do Santos e na sua temporada pelo Cosmos, de Nova York, Pelé granjeou um número incontável de admiradores. De gente simples e anônima a artistas como Robert Redford e William Hurt, chefes-de-estado com Mikhail Gorbatchóv e Bill Clinton, papas, reis e rainhas. Todos eles prestaram suas homenagens ao Rei Pelé.



Quando parou definitivamente em 1977, já havia se transformado numa lenda. Primeiro, com o gol mil em 1969. Depois com a Copa de 70. Entretanto, o reconhecimento absoluto viria em 1981, quando foi escolhido o Atleta do Século numa eleição patrocinada pelo jornal francês L'Equipe em conjunto com outros 19 periódicos do mundo inteiro.

Hoje, aos 57 anos, Pelé é o cidadão mais conhecido do planeta. Seu nome é uma marca mais conhecida do que Aspirina ou Coca-Cola e sua imagem movimenta o equivalente a 200 milhões de dólares por ano. Com um patrimônio pessoal na casa dos 25 milhões de dólares, Pelé vive pelo mundo levando o futebol e o nome do Brasil para todos os campos. Atualmente, é Ministro Extraordinário dos Esportes, no Brasil.

DE GÊNIO Zigue-zague em meio à defesa adversário, chapéu rente à cabeça dos zagueiros, cortes precisos com as duas pernas. Pelé foi sem dúvida o craque com maior repertório de jogadores que já existiu. Dele, dizem ainda que era craque em todas as posições. Mas também foi um inventor. É de sua lavra a paradinha na hora do pênalti bem como a tabelinha na perna dos beques.

Na paradinha, Pelé colocava a bola na marca para bater o pênalti e corria para chutar. Só que na hora exata, travava a corrida. Era o suficiente para o goleiro já pular para um canto. Assim, o Rei simplesmente rolava a pelota para o lado oposto. Bola de um lado, goleiro do outro.

Já a tabela com os adversários foi uma invenção que aconteceu por acaso. Certa feita, Pelé errou um passe, ma a bola bateu na canela do beque e sobrou de volta em posição excelente. Outro jogador qualquer, agradeceria a sorte e simplesmente chutaria para gol. Pelé não. Seu gênio vislumbrou naquele lance fortuito uma jogada da qual poderia se valer nas ocasiões mais difíceis. Assim nasceu a tabelinha na perna dos adversários.





Jogos em Copas



15/06/58 2 x 0 URSS

19/06/58 1 x 0(1) País de Gales

24/06/58 5 x 2(3) França

29/06/58 5 x 2(2) Suécia

30/05/62 2 x 0(1) México

02/06/62 0 x 0 Tchecoslováquia

12/07/66 2 x 0(1) Bulgária

19/07/66 1 x 3 Portugal

03/06/70 4 x 1(1) Tchecoslováquia

07/06/70 1 x 0 Inglaterra

10/06/70 3 x 2(2) Romênia

14/06/70 4 x 2 Peu

17/06/70 3 x 1 Uruguai

21/06/70 4 x 1(1) Itália





HOMENAGENS



"O maior jogador de futebol do mundo

foi Di Stefano. Eu me recuso a classificar Pelé

como jogador. Ele está acima de tudo"



(PUSKAS, craque do escrete húngaro

que dominou o futebol no início dos anos 50)

"Se Pelé não tivesse nascido homem

teria nascido bola"



(ARMANDO NOGUEIRA, jornalista)

"Pensei: ele é de carne e osso como eu. Me enganei"



(TARCISIO BURGNICH, defensor italiano na Copa de 70)

"Pelé é o único que ultrapassa os limites da lógica"



(CRUIJFF, comandante do Carrossel Holandês

na Copa de 74)

"Senti medo, um terrível medo quando vi

aqueles olhos. Pareciam olhos de um animal

selvagem, olhos que soltavam fogo"



(OVERATH, jogador alemão nas Copas de 66 a 74)

"Pelé desequilibrou o mundo"



(GILMAR, goleiro do Santos e da Seleção)





Números em Copas



Pontos: 37

Jogos: 14

Vitórias: 12

Empate: 1

Derrota: 1

Gols: 12

Média de Gols: 0,8





OS NÚMEROS DO REI



1.279 gols. Só perde para Friendenreich

com 1.329 gols reconhecidos pela FIFA,

apesar de não documentados

11 vezes artilheiro do Campeonato Paulista

(de 1957 a 1965, 1969 a 1973). Quem mais se

aproximou foi Friendenreich, com 9 artilharias

no tempo do futebol amador

58 gols em um único campeonato, o Paulista

de 1958. Abaixo só aparece ele próprio, com 49

gols em 1945

1.091 gols por um único clube, o Santos

95 gols pela Seleção Brasileira. O segundo

lugar cabe a Zico, com 67 gols

49 gols marcados em um único clube,

o Corinthiansm entre 1957 e 1974

65 gols entre 1975 e 1977, nas 111 partidas

que disputou pelo Cosmos de Nova York

32 títulos de campeão, uma média de 1,5 por ano

23 outros títulos de campeão em torneios

não-oficiais, o que sobe a média total para 2,6 por ano





AS OBRAS-PRIMAS



Gol da Afirmação

19 de julho de 1958, Estádio Nya Ullevi, Gotemburgo, Suécia,

Brasil 1 x 0 País de Gales. A bola vem da direita, Didi ajeita de

cabeça para Pelé que mata a bola no peito, dá um semilençol no

adversário e toca para o canto direito do arco. Foi seu primeiro

gol em Copa do Mundo. É considerado pelo próprio Pelé o gol mais

importante da sua carreira, o gol da confiança, da afirmação

Gol Mais Bonito

11 de Novembro de 1959, estádio do Juventus, na Rua Javari,

Santos 5 x 1 Juventus. Pelé recebe a pelota de Coutinho na entrada

da grande área. Sem deixar cair no chão, dá três chapéus em três

defensores. Dá ainda um quarto chapéu no goleiro Mão-de-Onça e, ainda

sem deixar a bola tocar o solo, mergulha de cabeça para completar

uma grande obra-prima

Gol de Placa

5 de março de 1961, estádio do Maracanã, Santos 3 x 1 Fluminense.

Pelé pegou a bola fora da área do Santos e partiu para o gol adversário.

Passou entre Valdo e Edmilson, enganou Clóvia, saiu de Altair, fintou.

Pinheiro, driblou Jair Marinho, tocou na saída de Castilho. Pelé venceu.

sete jogadores do Fluminense e marcou o gol que lhe deu direito a placa de bronze no hall de entrada do Maracanã. Daí nasceu a expressão "gol de placa".

Gol de Tabela

11 de outubro de 1962, Estádio da Luz, Lisboa, Portugal, Benfica 2 x 5

Santos. Zito toca para Pelé. O Rei chuta a bola nas pernas do zagueiro Coluna.

A bola volta e Pelé passa para Coutinho. Continho devolve para Pelé, para

Coutinho, para Pelé, para Coutinho, para Pelé que passa pelo zagueiro Cavém e chuta na saída do goleiro. Gol da descisão em que o Santos se tornou o Campeão Mundial Interclubes e que ilustra a famosa tabelinha com o parceiro Coutinho.

Gol do Meio do Campo

19 de junho de 1977, Estádio Rutherford, New Jersey, Estados Unidos, Cosmos 3 x 0 Tampa Bay. Pelé percebe o goleiro adiantado e chuta do meio do campo. O Rei marca o gol que tentara na Copa de 70, para delírio dos torcedores norte-Americanos





OS LANCES HISTÓRICOS



CHUTE DO MEIO DO CAMPO

Pelé percebeu o Goleiro Viktor, da Tchecoslováquia,

adiantado e deu um chute de 70 metros, direto do meio do campo.

Viktor voltou desesperado mas a bola raspou a trave.

MAIOR DEFESA

Cruzamento na área e Pelé acerta uma cabeçada

certeira. A bola toca no chão e vai entrando quando

o goleiro Banks, da Inglaterra, se estica todo e espalma

A bola sobe e sai por cima do gol. A defesa passou a ser

considerada a maior de todos os tempos

TIRO DE PRIMEIRA

O goleiro uruguio Mazurkiewicz bate o tiro de meta errado

e Pelé, da intermediária, emenda de primeira para o gol. O goleiro

ainda tem tempo de se recuperar e encaixar a bola.

DRIBLE DE CORPO

A jogada mais plástica da Copa de 70. Tostão lança Pelé

e o goleiro Mazurkiewicz sai para dividir. Pelé passa pela

bola que também passa pelo uruguaio. O Rei dá a volta no

goleiro e chuta. A bola trisca a trave e vai para fora.







[Manchete Esportiva, 08/03/1958]


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